Em tempos onde a realidade é medida por algoritmos, a soldado Mayara Kelly se viu no fio da navalha entre vocação e exposição. Ao publicar vídeos que mostravam sua rotina como policial, foi punida com dois dias de permanência disciplinar — sanção prevista no Código Militar cearense, que prevê reclusão na OPM sem restrição de compartimento. O motivo? Mostrar a prática, de farda, de técnicas como o torniquete — instrumento vital, que salvou a vida de seu irmão, também PM, baleado em combate.
Mayara, 30 anos, mãe, esposa e mulher de farda, teve sua conduta considerada infração aos deveres de discrição e zelo pela imagem da corporação. A PMCE reforçou a necessidade de se manter os pilares da hierarquia e disciplina, valores quase sagrados em uma instituição bicentenária. Mas onde termina a tradição e começa o direito à expressão?
"Estudei pra valer, não me importava com mais nada além de passar", ela contou. Desde 2016, lutava por essa vaga. Seu perfil nas redes, com 46 mil seguidores, mescla maternidade e rotina operacional. Entre posts e patrulhas, surge a pergunta: existe espaço para humanidade sob o peso da farda?
A defesa classifica a punição como um equívoco interpretativo. Para ela, o vídeo era utilidade pública, não autopromoção. Nas entrelinhas, o dilema da PM reflete uma tensão maior: o de ser agente da lei sem abdicar da própria voz.